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Carmen Barradas

Escrito por Eliana Monteiro da Silva - julho/2016

Carmen Barradas (1888 - 1963)

Biografia

        A compositora uruguaia Maria del Carmen Pérez Giménez, conhecida por Carmen Barradas, nasceu a 18 de março de 1888, em Montevidéu. Primeira dos três filhos de Santos Gimenez Rojas e Antonio Pérez Barradas, imigrantes espanhóis, aos 5 anos manifestou habilidade para a música e aos 6 iniciou os estudos de solfejo com o professor Antonio Frank.

        A morte precoce do pai em 1898 obrigou-a a interromper os estudos por dificuldades financeiras. Auxiliada por amigos da família passa a ter aulas de piano com Albina Miraldi de Ranieri e ingressa no Conservatório La Lira em 1904, mediante bolsa de estudos indicada pelo professor Martín Lopes.

        Aos 27 anos forma-se professora de piano pelo Conservatorio del Uruguay, sob orientação de Aurora Pablo. Neste mesmo ano de 1915 ela e sua família trocam o país natal pela Espanha, onde seu irmão Rafael já estudava pintura há dois anos. Antonio, o mais novo dos três, se dedica à poesia. Foi ele quem escreveu a primeira biografia do irmão Rafael Barradas, que se tornaria uma referência na pintura uruguaia.

        Instalando-se em Barcelona, Carmen, sua mãe e sua cunhada passam a trabalhar na confecção de bonecas de pano para obter o sustento da família. A fabricação de brinquedos era, provavelmente, uma atividade comum aos imigrantes. Também o pintor uruguaio Joaquín Torres Garcia conseguira neste ramo seus primeiros rendimentos. Amigo de Rafael, é ele quem apresenta Carmen a pessoas influentes para que exiba suas composições naquele país.

        Apesar das iniciativas de Torres Garcia, não seria antes de 1920 que o público e a critica catalã conheceriam as obras de Carmen Barradas. Não obstante, a compositora produziu em Barcelona suas peças mais significativas. Em 1922 seu estilo impressionista, repleto de sentimento e sensualidade, atraiu para si diversos elogios. Estes atributos foram em seguida trocados pelas técnicas advindas do movimento Futurista e Cubista, que ecoavam na Espanha nas primeiras décadas do século XX.

        O ambiente artístico europeu após a Primeira Guerra viu florescer ideias novas e extravagantes. Na Itália o Futurismo cultuou a velocidade e a força de trabalho, enquanto na França o Cubismo pregou a desconstrução de figuras e a colagem de materiais antagônicos. Adepto destas correntes, Torres Garcia diria em manifesto que se não havia um caminho para seguir em frente, cada artista deveria ser o seu próprio caminho.

        Envolvida com estas questões, Carmen compõe inspirada pelo ruído das fábricas, pelo movimento das cidades grandes, pelas cores e pelos sons vibrantes. Cerceada pela escrita tradicional, propõe uma notação pessoal que mais se assemelha às caricaturas e esboços a lápis dos pintores com quem convivia. Seu tríptico Fabricación, Aserradero y Fundición impressionou a crítica e motivou a criação de obras como Piratas e Taller Mecánico, entre outras. Vistas nos dias de hoje, um analista diria que tais partituras fazem parte da produção musical da vanguarda de 1960 na América Latina, e não da década de 20 como são de fato. O que se vê são traços, espirais, números e pequenos símbolos inventados para representar os sons imaginados pela artista.

        O ano de 1928 é crucial para a família Barradas. A difícil situação econômica e a doença de Rafael tornam impossível a vida na Europa. A volta ao Uruguai é traumática: os irmãos são ignorados por seus pares no meio musical e artístico, taxados de imitadores das novas correntes europeias. Naquele momento, a América Latina em geral estava justamente rompendo com os modelos das antigas metrópoles e resgatando suas raízes indígenas e pré-colombianas, no chamado movimento Modernista.

        Com a morte de Rafael em 1929 Carmen retoma o trabalho de professora de música no Instituto Normal. Sem se deixar abater pelo boicote às suas composições, insere na música didática seu conhecimento e criatividade. Cria métodos de ensino para crianças e jovens onde explora ritmos e melodias rio-platenses com tratamento elaborado. Compõe música de câmara para uso próprio com os alunos.

        Não bastasse a luta sem tréguas de Carmen Barradas pela sobrevivência e por sua música, a artista ainda verá a morte de Rafael, da mãe, da cunhada, e do irmão menor. Sem filhos ou sobrinhos, sua obra se perde quase completamente. À amiga Neffer Kröger, pianista e pesquisadora, se deve a divulgação e preservação de quase 170 composições desta importante autora uruguaia. Outra pesquisadora que vem divulgando a importante contribuição de Carmen Barradas à música latino-americana e internacional é Adriana Santos Melgarejo.

Composições

        A primeira composição de Carmen surgiu, provavelmente, em 1906. O título é bastante sugestivo, dadas as dificuldades por que passou e o pouco reconhecimento que alcançou durante a vida: Ilusión de Artista. Seguem-se a esta as Miniaturas, apresentadas pela autora assim que chega a Barcelona (1915), Baile Inglés (1920), Esperando el coche (1923), entre outras. São obras de estilo romântico e/ou impressionista, baseadas no tonalismo mas com adição de cromatismos, acordes com sextas e sétimas sem resolução imediata e notas pedais para dar colorido e atmosfera sensual. Esperando el coche tem a particularidade de inserir a percussão de guizos aos sons do piano, que devem ser presos ao pulso do (a) pianista.

        Os sons da Espanha, com elementos do violão rasgueado e ritmos de flamenco estão em Bodas en la aldea (1919). Composições com temáticas desta natureza são totalmente abandonadas pelas cenas turbulentas do dia a dia, assim que a autora se insere no grupo de Rafael e conhece artistas como Juán Miró, Salvador Dalí, entre outros.

        Desta fase é o tríptico Fabricación, Aserradero y Fundición, composto em 1922, que reproduz ao piano os sons das fábricas, das engrenagens e dos apitos ouvidos nas metrópoles. Carmen utiliza arpejos em movimento contrário em ambas as mãos, em velocidade rápida e intensidades fortes. As notas não visam delinear melodias ou acompanhamentos, e sim criar atmosferas. Sons individuais, acordes, gestos e ritmos são usados como peças de um brinquedo de montar, justapostos, sobrepostos, encadeados.

Suas composições têm um tratamento construtivista particular que se caracteriza pela busca da liberdade formal, o uso de diversos planos sonoros e a exploração tímbrística. O âmbito da composição acadêmica uruguaia precisou esperar mais de 40 anos para ter algo da dimensão inovadora da obra de Barradas (SANTOS MELGAREJO, 2013).

        Outras obras relevantes são La niña de la mantilla blanca, dedicada a Joaquín Torres García, Oración a Santos Vega, Aurora en la enramada, Procesión en Hospitalet de Llobregat e Estudio en si bemol menor antiguo. Esta última foi composta em 1941 e posteriormente dedicada a Neffer Kröger.

Para conhecer sua obra

1. SANTOS MELGAREJO, Adriana. Carmen Barradas. La hermana compositora. Una vanguardia olvidada. In: El Cultural (El País de Montevideo), 21/09/2012.

2. ____________________________ Carmen Barradas: la hermana compositora (vídeo). https://youtu.be/vSXHMicrzUg

3. The Norton/Grove Dictionary of Women Composers, de Julie Anne Sadie & Rhian Samuel (Ed). New York, London: The Macmillan Press Limited, 1995. p. 38.

4. KRÖEGER, Néffer. Fabricación, de Carmen Barradas (vídeo). Disponível em: https://youtu.be/ivt_rZdW6eY

5. ________________. Estudio Rítmico Tonal em si bemol antiguo, de Carmen Barradas (vídeo). Disponível em:  https://youtu.be/TLbKt4ZpH7U

6. ________________. Esperando el coche - para piano y cascavel (vídeo). https://youtu.be/BXGRnk3w5XE

7. TOSAR, Héctor. Oración a Santos Vega, de Carmen Barradas (gravação). https://youtu.be/uBEl0hFKEl8

8. BARRADAS, Carmen. In: Vikipèdia, l’enciclopèdia lliure. Disponível em: https://ca.wikipedia.org/wiki/Carmen_Barradas

Carmen Barradas (1888-1963)

Biography

        The Uruguayan composer Maria del Carmen Pérez Giménez, also known as Carmen Barradas, was born in Montevideo in March, 17, 1888. First of three children of Santos Giménez Rojas and Antonio Pérez Barradas, Spanish immigrants, she showed musical skills and she was 5 years old, beginning her solfeggio studies at the age of 6 with master Antonio Frank.

        The early death of her father in 1898 caused her to suspend her studies due to  the deriving financial difficulties suffered by her family. Through the help provided by family friends she could begin piano classes with Albina Miraldi de Ranieri, entering the conservatory La Lira in 1904 through a scholarship recommended by professor Martín Lopes.

        At the age of 27 she graduated as piano professor at the Conservatorio del Uruguay, under the guidance of Aurora Pablo. In that same year of 1915 she and her family moved to Spain where her brother Rafael was already studying painting for two years. Antonio, her youngest brother, was dedicated to poetry and wrote the first biography of the painter Rafael Barradas, his brother, who later became a reference in the Uruguayan painting scenario.

        Established in Barcelona, Carmen, her mother and her step sister began working with rag dolls craftwork in order to support their living expenses. Dolls and toys manufacturing was probably a common activity among immigrants by then. Even the Uruguayan painter Joaquín Torres Garcia earned his first wages in this field. A friend of Rafael’s, Torres Garcia was responsible for Carmen’s introduction to influential people in her newly adopted country, easing her path to present her compositions there.

        Despite these initiatives by Torres Garcia, it was only in 1920 that the public and the Catalan critics got to know the compositions by Carmen Barradas. Nevertheless, the composer produced her most significant musical pieces during her period in Barcelona. In 1922 her impressionist style, filled up with feeling and sensuality, attracted several compliments and positive mentions. These attributes were soon substituted by techniques deriving from the Futurist and Cubist movements that echoed in Spain in the first decades of the Twentieth Century.

        The European artistic ambiance saw the growth of new and extravagant ideas right after the First World War. In Italy for instance the Futurism trend praised speed and work force while in France Cubism preached the deconstruction of figures and the collage of antagonistic materials. Being a supporter of these streams of thought, Torres Garcia said in a manifesto that if there was not a path to follow ahead, each artist would need to be his or her own path.

        Involved with these questions, Carmen produced compositions inspired by the noise of industrial plants, the movement of big cities, colors and vibrant sounds. Limited by traditional writing, she proposed a personal type of notation that resembles pencil caricatures and sketches made by the painters she closely interacted with. Her triptych Fabricación, Aserradero y Fundición impressed the critic and led the creation of following works such as Piratas and Taller Mecánico, among others. Under the eyes of a today’s analyst, these scores could be assumed as part of the musical vanguard of the 1960’s in Latin America and not of the 1920’s as they were as a matter of fact. The records that can be seen are traces, spirals, numbers and small symbols invented to represent the sounds imagined by the artist.

        The year of 1928 was crucial to the Barradas family. The difficult economic situation and the illness of Gabriel made it impossible for them to remain in Europe. The return to Uruguay turned to be a trauma: the brothers were ignored by their peers in the music and artistic scenes and they were labeled as imitators of the new European movements. At that moment Latin America was just seeing a rupture towards the old metropolis’ models and, in an opposite move, praising and retaking the native American and Pre-Columbian roots in the so called Modernist movement.

        After Rafael died in 1929 Carmen retook the activities as music professor at the Instituto Normal. Even considering the boycott her compositions were facing Carmen remained true to her beliefs and incorporated her knowledge and creativity into her music teaching. She produced teaching methods focused in children and youngsters which explored rhythms and melodies from the Rio de la Plata region under elaborated treatment. Furthermore, she also composed chamber music for the usage with her students.

        As if her non-stop struggle for survival and for her music was not enough, Carmen Barradas would still witness the death of Rafael, her mother’s, her sister in law’s and her little brother’s. Without children of her own and without nephews Carmen’s music was lost almost in its entirety. Her friend, the pianist and researcher Neffer Kröger, has been the responsible for the diffusion and preservation of almost 170 compositions by this important Uruguayan author. Another researcher that has been promoting the remarkable contribution made by Carmen Barradas to the Latin American and international music is Adriana Santos Melgarejo.

Compositions

        Carmen’s first composition is, supposedly, from 1906. Its title is very suggestive, under the light of all difficulties Carmen faced and the little recognition she achieved in life: Ilusión de Artista. The following works were Miniaturas (1915), disclosed by the author right after her arrival in Barcelona, Baile Inglés (1920), Esperando el coche (1923), among others. These works are examples of the romantic and/or impressionist styles, based on tonalism but considering the addition of chromatic values, chords in sixths and sevenths without immediate resolution and pedal notes to create a colorful and sensual atmosphere. Esperando el coche has the particularity of inserting rattles percussion sounds to the piano execution, through these instruments fixing to the pianist’s wrists.

        The sounds of Spain, the elements of the guitar rasgueado technique and the flamenco rhythms are present in Bodas en la aldea (1919). Compositions with this nature of themes were totally abandoned in exchange for the turbulent day-to-day  scenes once the author began to participate in Rafael’s group and got to know artists such as Juán Miró, Salvador Dalí, among others.

        The tryptic Fabricación, Aserradero y Fundación (1922) is from this phase and reproduces on the piano the sounds of industrial plants, the engine gears and the whistles heard in the metropolis. Carmen uses arpeggio in counter-movement with both hands in high speed and with strong intensities. The notes are not intended to  outline melodies or accompaniment but to create atmospheres. Individual sounds, chords, gestures and rhythms are used as pieces in a building toy, juxtaposed, superposed and chained.

 

Her compositions have a particular constructivist treatment characterized by the search of formal freedom, the usage of several sound plans and the timbre exploration. The range of the Uruguayan academic composition had to wait more than 40 years to reach something of the innovative dimension of Barradas’ works. (SANTOS MELGAREJO, 2013).

        Other relevant works by Carmen are La niña de la mantilla blanca, dedicated to Joaquín Torres García, Oración a Santos Vega, Aurora en la enramada, Procesión en Hospitalet de Llobregat and Estudio en si bemol menor antiguo. This last work was composed in 1941 and afterwards dedicated to Neffer Kröger.

More Information

1. SANTOS MELGAREJO, Adriana. Carmen Barradas. La hermana compositora. Una vanguardia olvidada. In: El Cultural (El País de Montevideo), 21/09/2012.

2. ____________________________ Carmen Barradas: la hermana compositora (video). https://youtu.be/vSXHMicrzUg

3. The Norton/Grove Dictionary of Women Composers, by Julie Anne Sadie & Rhian Samuel (Ed). New York, London: The Macmillan Press Limited, 1995. p. 38.

4. KRÖEGER, Néffer. Fabricación, by Carmen Barradas (video). Available in: https://youtu.be/ivt_rZdW6eY 

5. ________________. Estudio Rítmico Tonal en si bemol antiguo, by Carmen Barradas (video). Available in:  https://youtu.be/TLbKt4ZpH7U

6. ________________. Esperando el coche - para piano y cascavel (video). https://youtu.be/BXGRnk3w5XE

7. TOSAR, Héctor. Oración a Santos Vega, by Carmen Barradas (album record). https://youtu.be/uBEl0hFKEl8

8. BARRADAS, Carmen. In: Vikipèdia, l’enciclopèdia lliure. Available in: https://ca.wikipedia.org/wiki/Carmen_Barradas  

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